O planejamento é a principal ferramenta para se obter
segurança em qualquer tipo de organização. Quando falamos em sucessão familiar,
se torna ainda mais importante porque, além da empresa, há a questão do
patrimônio familiar envolvida. Por meio do planejamento sucessório é possível
criar e estruturar um conjunto de medidas de prevenção por meio de ações
estratégicas, que visam evitar riscos na perda de bens imóveis, móveis,
recursos financeiros e negócios societários. “O objetivo é garantir que a
formação do patrimônio em médio e longo prazo originará frutos para as próximas
gerações, com a utilização de recursos visando eficiência e economia
tributárias”, explica o advogado tributarista Marco Aurélio Poffo, sócio do
BPH Advogados. Outra estratégia é o planejamento
patrimonial, que organiza a transferência de bens e patrimônio de uma pessoa
ainda em vida, aos seus respectivos herdeiros, sem violar princípios e
garantias legais.
A lei brasileira não
confere liberdade total e irrestrita de disposição do patrimônio (em vida ou em
morte). A atual legislação garante aos herdeiros (descendente, cônjuge e
ascendente, respeitada a ordem de vocação hereditária) o direito de receber a
metade do patrimônio do falecido, calculado sobre o valor dos bens existentes à
época da abertura da sucessão, sendo esse direito denominado “legítima”.
"Embora muito questionada sob o ponto de vista da limitação da vontade da
parte, a justificativa para inclusão no sistema Jurídico da reserva hereditária
de metade dos bens da herança é a valorização da família na sua função
solidária, garantindo aos herdeiros necessários mecanismos financeiros para
seguirem suas vidas, dando a ideia de continuidade e preservação do patrimônio
familiar", explica Poffo.
A legítima traz,
portanto, uma restrição em relação à disposição de patrimônio, quer seja na
doação de bens em vida, ou na transferência post mortem através de
testamento, permitindo que qualquer pessoa disponha de apenas 50% do total do
seu patrimônio através de testamento ou doação. Nesse sentido, toda e qualquer
operação realizada que desrespeitar o direito dos herdeiros poderá ser
discutida judicialmente, reduzindo o excedente da parte disponível, na hipótese
de doação ou, no caso de testamento, podendo ser determinada a redução das
disposições testamentárias ou o rompimento do testamento.
Venda e doação de
pais para filhos
Outra restrição legal
que deve ser sempre observada por quem pretende dispor de seu patrimônio diz
respeito a doação ou venda de bens de pais para filhos, pois embora tais
práticas não sejam proibidas, a lei impõe a observância de certas
particularidades para cada uma das situações. "No caso de venda de bem,
por exemplo, a restrição consiste na impossibilidade de alienação de ascendente
a descendente, sem o expresso consentimento dos demais herdeiros necessários,
sob pena de anulação do negócio realizado. A justificativa para a limitação
imposta por lei é assegurar que a venda seja real, com preço justo e de
mercado, evitando-se, assim, prejuízo aos demais herdeiros", aponta o
especialista.
Já na doação de pais em
favor de filhos, conforme explica Poffo, os bens doados serão tidos como
uma antecipação ou adiantamento da herança, devendo o filho que recebeu a
doação informar no futuro inventário do doador o bem recebido de forma
antecipada, para fins de apuração de sua parte na legítima, preservando a
igualdade dos herdeiros na partilha, sob pena de perder o direito sobre o bem
intencionalmente sonegado. Porém, há uma exceção à regra de antecipação de
legítima no caso da doação a herdeiro necessário. Se o doador dispensar a
colação, declarando no instrumento de doação que o bem saiu da sua parte
disponível, ou seja, da metade do patrimônio que a lei lhe permite dispor da
maneira que melhor entender, o herdeiro ficará desobrigado de informar tal
doação no inventário, não integrando o bem recebido (ou seu valor equivalente)
o patrimônio a partilhar.
Esses mecanismos legais
tentam evitar a fraude, protegendo o núcleo familiar e a legítima dos
herdeiros. "Desta forma, observamos que um planejamento patrimonial e
sucessório deve sempre partir das peculiaridades e limitações em relação a disponibilidade
de bens, lembrando, porém, que há ainda muito espaço para tratar deste tema de
forma a ajustar a vontade familiar, visando reorganizar a totalidade do
patrimônio, buscando-se sempre o menor custo tributário, a continuidade e
preservação patrimonial e, ainda, o menor impacto nas relações afetivas e
familiares", observa Poffo.