As
guerras são por natureza imprevisíveis e suas consequências
inesperadas. No caso específico da invasão Russa contra a Ucrânia
até pouquíssimo tempo atrás diversos analistas especializados em
relações internacionais acham que seria pouco crível a
possibilidade de um conflito bélico entre estes dois países, e que
a mobilização de tropas russas na fronteira ucraniana não passava
uma forma do Kremlin
pressionar o governo ucraniano que flertava em aderir à OTAN –
Organização do Tratado do Atlântico Norte. Não há como não se
lembrar de uma celebre frase de Marques de Maricá: “Os
homens preferem geralmente o engano, que os tranquiliza, à
incerteza, que os incomoda.” E
para infelicidade de todos, muitos dos analistas erraram em seus
prognósticos.
Um
dos primeiros efeitos do conflito foi a escalada dos preços de
commodities agrícolas e energéticas. A Ucrânia é grande produtor
de grãos e maior exportador global fertilizantes têm sido
impactadas diretamente na sua cadeia de produção em virtude do
conflito em seu território. Enquanto a Rússia, que é grande
produtora e exportadora de trigo, milho, petróleo e natural foi
diretamente impactada por sanções de diversos países ocidentais,
prejudicando sobremaneira o fluxo destes produtos para o mercado
global. Para se ter uma ideia, o impacto no preço do petróleo
corresponde a um aumento de 30% sobre os preços previstos antes da
guerra.
Além
imensurável crise humanitária que assola a população Ucraniana,
com milhões de refugiados tentando escapar dos efeitos diretos da
Guerra, o conflito poderá acarretar consequências até o momento
incalculáveis para toda a população mundial, como uma crise
alimentar em virtude do desabastecimento de grãos e fertilizantes.
Como
exemplo, aqui no mercado interno brasileiro, nas últimas semana
sentimos o aumento considerável dos combustíveis e de produtos que
utilizam o trigo como insumo. Diversos setores já sentem os impactos
imediatos da guerra, como o setor de logística, transportes públicos
e aplicativos de entregas.
Dados do último relatório FOCUS do Banco Central
apontam que a perspectiva inflacionária para este ano aumento 1
ponto percentual nas últimas 4 semanas, onde o IPCA previsto para
este chega 6,59% com tendência de alta. Como consequência, a taxa
básica de juros deve fechar o ano acima de 13%, impactando
diretamente a atividade produtiva. O Boletim Macro de março da
FGV-IBRE, aponta que o aumento da inflação e o desarranjo na cadeia
de suprimentos em virtude da guerra já impacta o Índice de
Confiança dos Empresários que teve um recuo 1,2% em relação ao
mês anterior.
Os efeitos da guerra somados à proximidade do período
eleitoral vêm obrigando o governo brasileiro a anunciar diversas
medidas nos últimos dias, como tentativa de atenuar os impactos na
economia, como a “injeção de 150 bilhões de reais” em medidas
como a liberação de novo saque do FGTS; a criação de programa de
microcrédito digital; a ampliação de empréstimos consignados e a
antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS.
Além disso, o Ministério da Economia zerou até o final do ano as
alíquotas de importação de alguns produtos, como macarrão, óleo
de soja e outros para ajudar na queda da inflação.
Como
se não bastasse as agruras da guerra, os novos surtos de Covid-19 e
os consequentes lockdowns
em diversas províncias chinesas são um componente adicional de
incerteza sobre a economia mundial.
O
momento requer muita atenção, em especial às medidas do governo
para mitigar os efeitos da crise internacional sobre a economia
brasileira sem deteriorar o nosso já combalido quadro fiscal e muita
resiliência para desbravarmos este ano desafiador.
Fernando Cavalcanti, economista, vice-presidente do
Nelson Willians Group
Fabio Araújo, economista, especialista em economia
urbana e engenharia financeira