Para além de compartilhar as experiências do processo da residência “[re]existência: fracasso é potência”, realizada pelo coletivo "ensaio para algo que não sabemos", a pré-estreia do documentário, que leva o mesmo nome da residência, feito por Carolina Janning, aconteceu na última quarta-feira (10), na Escola Osvaldo Galupo e também reforçou a importância do autocuidado entre as mulheres e de uns com os/as outros/as.
O público, formado por estudantes e professores da Educação de Jovens e Adultos (EJA) da escola, localizada no Morro do Horácio, em Florianópolis, pode ter o contato com o fazer artístico e, depois, conversar sobre o processo de produção com as artistas presentes com direito, inclusive, a reproduzir uma vivência que foi feita durante os dias de residência e que causou curiosidade nos espectadores.
A noite começou com Karina Collaço, idealizadora do projeto e integrante do coletivo ao lado de Loren Fischer e Monica Siedler, apresentando a ideia do projeto e o conceito de residência artística. Os estudantes foram chegando aos poucos. Uma das alunas da EJA levou o filho que, conforme o aluno Márcio e o professor Antony explicaram que, uma das políticas que a escola adotou para evitar a evasão de alunos e alunas do EJA é a de deixar que as mães possam levar suas crianças para a aula, pois muitas vezes não tem com quem deixá-las.
Ao todo, seis estudantes, três professores, seis pessoas da equipe e uma participante da residência formaram a plateia da pré-estreia do documentário. “Fazer a primeira exibição pública do documentário aqui na escola é o mínimo de retorno que podemos dar, a entrega deste registro deve ser feita a quem paga, através de impostos, o trabalho que fazemos com dedicação e resistência”, explicou Karina.
Durante a sessão, foi possível perceber algumas inquietações dos estudantes. Talvez pela disponibilidade de contato e entrega que eles assistiram das artistas, ou pela diversidade de corpos existentes durante a residência ou, ainda, por estarem frente a algo novo, ainda não visitado por eles e elas. Talvez, também, porque a pessoa estava se questionando quanto tempo ainda duraria “aquilo”.
Fato é que, após a exibição do documentário, Loren propôs uma roda de conversa e a primeira resposta que deu foi se todas da residência já se conheciam; na sequência, a dúvida colocada foi sobre a conchinha feita com as mãos e empostada nos olhos, vivência sugerida por Elke Siedler durante a residência. Para explicar melhor tal dinâmica, Loren sugeriu que todos fizessem o movimento e foi guiando, para que eles pudessem sentir o que aquele simples gesto de autocuidado, que é gratuito, pode proporcionar quase que instantaneamente.
O reforço, após a vivência, foi sobre a importância de cada um sentir o seu próprio corpo, perceber a respiração e o que ela causa no corpo, para além do respirar pelo simples fato de respirar. Esse exercício é gratuito e pode ser feito a qualquer momento. Como complemento, Mônica trouxe a reflexão de que o ato de parar e se observar, pode significar um grande fracasso. “ Você ter tempo para simplesmente estar sentindo sua presença, pode ser muito revolucionário em um mundo que nos cobra tanto o trabalho, o horário, a correria, o chegar em algum lugar com nossos corpos, mas será que já não tem muita coisa acontecendo nesse aqui e agora?”, observou.
Na sequência, a participante da residência, Lily Chi, compartilhou como foi importante para ela o encontro entre as mulheres que participaram, o perceber o próprio corpo e o corpo da outra, através do tato, sempre com muito respeito e cuidado. “Desde questões como estar lá mesmo, presente na residência, foi um processo natural de ajuda com carona e realmente aconteceu a partir do olhar do cuidado. Foi um processo muito lindo e maravilhoso de viver”, contou. Ela ainda disse que ficou emocionada ao assistir ao documentário, foi como se tivesse vivido tudo novamente.
Na sequência, a professora Eliete quis saber sobre a ideia da van Expancine. de Thais Alemany, que foi o suporte ideal para a transmissão do filme. Thais contou que, em geral, as crianças ficam fissuradas na sua van, fazendo um paralelo com ter uma casa na árvore. “Elas reforçam a questão de a gente poder se encantar com algo colorido, em movimento, sem estar aplastado de tudo com essa nossa correria”, disse. De acordo com ela, a van é utilizada para facilitar o caminho artístico de produtos e serviços, tendo desenvolvido vários papéis, como: espaço para festas pequenas, teatro, exposição, já levou artistas para os mais diversos lugares. A expectativa é de que ela fique ainda maior e mais atrativa.
Um dos últimos retornos que foi compartilhado com o grupo foi do professor Matheus. Ele explica que entende o objetivo de o projeto ter sido desenvolvido apenas com mulheres, mas também aproveita para questionar sobre o cuidado e a falta dele entre os homens. “A maneira como nos relacionamos com nosso corpo, e como deixamos de nos relacionar com ele, pode reforçar as estatísticas sobre homens e violência, que mostram que eles colocam a vida deles e de outras pessoas, inclusive mulheres, em risco, de várias formas e com muito mais frequência que as mulheres”, observou.
O final da sessão foi com aplausos para o filme e para a roda de conversa que, com certeza, cumpriu seu papel de reflexão sobre como nos comportamos umas com as outras dentro de uma sociedade que ainda precisa pensar muito sobre o autocuidado.
A estreia oficial do documentário “[re]existência: fracasso é potência” será no dia 17 de maio, às 19h30, na Escadaria do Rosário, no Centro de Florianópolis.
A edição do projeto "ensaio para algo que não sabemos - por uma perspectiva dos encontros" é financiado com recurso público oriundo do edital de apoio às culturas 2021, com a participação institucional da Prefeitura Municipal de Florianópolis, da Secretaria de Cultura, Esporte e Lazer da FCFFC e do Fundo Municipal da Cultura.