Como você escolhe o seu médico? O cirurgião
oncológico, Rinaldo Danesi Pinto, responde:
Infelizmente, no Brasil este é um
privilégio de poucos. Sabemos que a grande maioria dos brasileiros não tem tal
oportunidade e é atendida pelos médicos dos serviços vinculados ao Sistema
Único de Saúde – e, vale ressaltar, na maior parte das vezes terão a felicidade
de ser cuidados por médicos qualificados, humanos e comprometidos com a saúde
pública. Mas, e aquele usuário da saúde suplementar ou que busca atendimento
particular? Como escolhe?
Uma pesquisa realizada nos Estados
Unidos mostrou que as pessoas gastam mais tempo à procura de um carro novo do
que pesquisando sobre um bom médico. De acordo com o relatório, a maioria dos
adultos investe de 10 horas a algumas semanas para escolher o veículo ideal
para comprar, enquanto gasta menos de uma hora investigando sobre um
profissional ou hospital quando precisa. Outro dado interessante vem do
relatório de um sistema internacional de busca por serviços médicos: o tempo de
tolerância do paciente para aguardar por um serviço de saúde que atenda sua
ligação para agendamento é de quatro minutos. Após essa espera, se não
atendidas, mais de 70% das pessoas passam para o profissional seguinte da
lista.
Nas minhas últimas férias com a
família, antes da pandemia, fiz pesquisas nos sites de busca de hotéis e
restaurantes analisando vários itens, mas principalmente a opinião dos
usuários. As pessoas tendem a ser críticas e este é um bom termômetro para não
se dar mal na escolha. Normalmente, falam da localização, limpeza e higiene,
atendimento, qualidade das refeições, preços etc. Infelizmente, para serviços
médicos e de saúde não temos uma cultura assim, nem sequer um serviço que
ofereça uma busca nestes moldes. Existe muita discussão ética sobre isso. Às
vezes o tratamento não deu certo pelo fato de a doença ser grave, e não por
falha do médico; às vezes o médico é qualificado para uma determinada situação,
mas não tanto para outra. São muitas as variáveis e, por isso, a avaliação é
delicada e gera controvérsias. Na minha opinião pessoal, acharia muito útil.
No entanto, enquanto não temos
ferramentas de busca tão elaboradas assim e tampouco um estudo sobre o tema no
Brasil, vale a pena nos questionarmos se estamos empenhando tempo e energia
suficientes na escolha de um profissional ou hospital que vá cuidar da nossa
saúde. Como escolher o melhor profissional para nosso caso? É claro que, em
situações de emergência, nem sempre podemos fazer isso. Mas em caso de uma
consulta ou procedimento cirúrgico eletivo, vale a pena pesquisar bem. Um hospital
ou plano de saúde contam com diversos médicos. Mas qual será o melhor para o
seu caso? Esta é uma boa pergunta para começar a fazer, e vou dar a seguir
algumas dicas que sigo sempre que estou no papel de paciente ou quando preciso
indicar um colega para um familiar, amigo ou paciente.
1. Entenda
qual é a especialidade adequada para seu caso
Um bom começo é priorizar qual é o seu
principal problema e procurar o especialista da área. Isso evita, muitas vezes,
demora no diagnóstico e no tratamento, além de não correr o risco do famoso
encaminhamento "au-au" – ao ortopedista, ao cirurgião, ao
cardiologista e assim por diante. Por exemplo, se você está com dor nos
joelhos, dê preferência a um ortopedista que atue mais especificamente nesta
área.
Muitas vezes é difícil para uma pessoa
que não é da área da saúde saber exatamente qual a origem do problema e que
especialidade procurar. Nessas situações, o melhor é procurar um clínico geral
ou médico de família, chamados médicos de atenção básica de saúde. Estes
profissionais costumam ter uma visão mais generalista da situação, conseguindo
com muita eficácia resolver a grande maioria das questões clínicas, além de
ajudar na indicação de especialidades pontuais quando necessário. Outra grande
vantagem do médico da atenção básica é que ele tem uma tendência maior para
trabalhar na prevenção. Não podemos esquecer que prevenir é a melhor forma de
nos mantermos saudáveis. O antigo ditado já dizia: "Melhor prevenir do que
remediar". Países desenvolvidos como a Inglaterra adotam esse modelo com
sucesso.
2. Procure
indicação de familiares, amigos e outros profissionais da saúde
Uma dica valiosa é a recomendação de
familiares e amigos que já passaram pela assistência de um médico ou serviço de
saúde. Mesmo sendo leigos na área da saúde, foram pacientes – e isso diz muito.
Viveram na pele a experiência. A boa relação médico-paciente e médico-família é
uma das principais virtudes de um médico. Quem passou por isso, tanto como
paciente ou como familiar, sempre terá a disposição e o prazer de relatar tal
experiência, sendo positiva ou negativa. O que precisamos fazer é tentar
identificar possíveis exageros (para o lado bom ou ruim) e sempre procurar
opiniões de mais pessoas. Por vezes o problema da relação é o paciente, e não o
médico. Ouvindo o maior número de pessoas, e com um ouvido mais crítico,
podemos ser mais certeiros na escolha.
A recomendação de outro médico ou
profissional da saúde também vale muito. Nem sempre as pessoas têm este acesso,
mas quando possível deve-se levar em conta. Certamente, um médico que já
conhece você e o seu caso vai ter uma facilidade maior de indicar o
profissional correto. Como em qualquer negócio o “boca a boca” costuma ser uma
propaganda honesta.
3. Fique
de olho no currículo
Lembra quando falei sobre a pesquisa
mostrando que as pessoas demoram mais para escolher um carro novo do que para
decidir quem vai cuidar da sua saúde? Pois é, quando pesquisamos um produto
temos o hábito de investigar procedência, especificações, qualidade, rendimento
etc. Procure criar este hábito também ao pesquisar um médico. Confirme se o
nome consta em pelo menos duas listas de referência: a do Conselho Regional de
Medicina e da Sociedade, Associação ou Colégio Brasileiro da especialidade a
que ele divulga pertencer. Graças à internet, é uma pesquisa simples hoje em
dia.
Outra opção é a busca pelo profissional
na Plataforma Lattes (cnpq.br),
uma base de dados de currículos na área de ciência e tecnologia do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Nem todos os
profissionais têm seu cadastro nesta plataforma, mas aqueles que estão
envolvidos com atividades acadêmicas e pesquisas geralmente possuem seu
currículo cadastrado ali. Uma ótima fonte para verificar todo o histórico da
formação profissional do médico, como também as publicações de livros, artigos
e trabalhos científicos. A medicina é uma ciência em constante evolução,
portanto o médico deve procurar estar sempre atualizado. Lembre-se disso.
4. Deve
transmitir confiança
A confiança no médico e no tratamento
faz diferença no enfrentamento da doença e na resiliência ao tratamento. Além
de atenção, o médico deve oferecer segurança ao paciente, demonstrar domínio
sobre o que está falando, dedicação e interesse no seu caso. E acima de tudo
deve ser franco e honesto, sempre alertando claramente dos riscos da doença ou
do tratamento, como também tranquilizando quanto ao suporte e amparo que irá
prestar. O paciente melhor informado sempre será um paciente mais engajado e
mais confiante. Afinal, a confiança é a base para que qualquer relação seja
duradoura, inclusive a do paciente com o médico.
5. Deve
ser uma boa pessoa antes de ser um bom médico
Entender a dor, a vontade e as escolhas
do paciente, sem preconceitos, é fundamental para um ótimo relacionamento
médico-paciente. O médico deve ser empático e acolhedor. Não existe mais espaço
para profissionais arrogantes, com o “rei na barriga”. Discutir seu caso com
colegas e outros profissionais de saúde não é sinal de ignorância. Muito pelo
contrário, é uma virtude. Reconhecer o valor de toda a equipe de cuidado e
evitar o egocentrismo é a melhor forma de um médico entregar o melhor cuidado
ao paciente. Más pessoas nunca serão bons profissionais. Lembre-se: não
tratamos a doença, e sim o paciente. Isso transforma a relação muito mais
complexa e delicada. Não aceite um mau atendimento. Você que está pagando, seja
pelo SUS, por convênios ou por seu próprio dinheiro, merece toda a atenção. Não
se contente com pouco. Afinal, é sua saúde que está em jogo.
E lembre-se: não deve ser sorteio, e sim escolha.